Docente universitário e Especialista em Política Social.
Nas últimas 24 horas, os debates e as conversas em todo o país giraram em torno de uma única expectativa: o que o Presidente da República vai dizer hoje, na Assembleia Nacional, sobre o Estado da Nação?
Em que estado está realmente o país? Terá o Chefe de Estado coragem de reconhecer a hecatombe em que se encontra o sector social? Dirá ele que as desigualdades persistem, que as assimetrias regionais permanecem intocáveis, e que o sistema de protecção social continua caótico – com cidadãos que envelhecem no activo, aguardando pela tão prometida reforma? Ou o discurso focará apenas nos feitos: o sucesso do Kwenda, o Programa de Luta e Combate à Pobreza, as infra-estruturas hospitalares inauguradas, as poucas escolas erguidas, os empregos criados na saúde e na educação? A inauguração da Refinaria de Cabinda e a ampliação e melhoria da Refinaria de Luanda? Ou falará ainda do sucesso da diplomacia económica, com a vinda do ex-presidente Joe Biden ao nosso país, em 2023 e do reconhecimento internacional de Angola na tentativa de resolução de conflitos regionais?
A pobreza – expressão extrema das desigualdades sociais – continua perene no país, e tudo indica que está longe de conhecer dias melhores. Entretanto, cresce o número de novos ricos e de pessoas com maior oportunidade de ascensão económica, revelando um contraste social cada vez mais profundo.
Uma outra dimensão sobre a qual muito se espera ouvir o Presidente da República diz respeito às estratégias e políticas voltadas para a juventude – uma categoria social indispensável ao desenvolvimento e que, nos últimos tempos, tem levantado a voz em apelo à intervenção estatal.
Embora existam várias juventudes, há, contudo, uma juventude que clama por oportunidades, por políticas públicas eficazes e inclusivas, por transformação social e acesso à habitação – uma das necessidades mais prementes deste grupo. Espera-se, portanto, uma resposta concreta aos problemas que afligem os jovens, não apenas promessas ou retóricas de ocasião, pois o discurso sobre o Estado da Nação constitui, assim, uma oportunidade ímpar para o governo reafirmar o seu compromisso com a juventude, com políticas que traduzam esperança em acções tangíveis.
Que Estado da Nação o povo quer ouvir?
O da televisão pública, cuidadosamente embelezado pelo dinheiro do erário, ou o da nação real – das lutas por alimentação, da pobreza que persiste, mas também dos pequenos avanços e do desenvolvimento que tarda?
Vivemos num país onde a classe média foi quase dizimada; onde o funcionário público, se não entrar em “esquemas”, dificilmente escapa da pobreza; onde a polícia, em vez de proteger, combate as convulsões sociais com repressão – sem explicações convincentes às famílias e à própria nação.
Que Estado da Nação é este que se anuncia às vésperas dos 50 anos de independência, celebrados com pompas, mas sem reformas estruturais profundas capazes de impactar a vida do cidadão comum?
Espera-se do presidente da república um discurso a altura da Angola real, que se renova, mas também se deoabate com enormes problemas. Uma Angola de esperança, de futuro, mas de uma necessidade urgente por progresso, por distribuição igualitária dos recursos.
Um discurso sobre o Estado da Nação é – ou deveria ser – um momento de verdade, de prestação de contas, sem política e farpas. É a oportunidade para o governo mostrar o que fez, reconhecer o que falhou e reafirmar o compromisso de servir o povo. Afinal, o governo é – ou deveria ser – um escritório público ao serviço da felicidade dos cidadãos, e não um instrumento de defesa de interesses de classe.
Se o discurso sobre o Estado da Nação é o reflexo da realidade dos últimos 365 dias, então, espera-se um discurso de esperança – e é isso que os angolanos aguardam. Esperam, igualmente, respostas concretas, não apenas diagnósticos ou intenções.
Se por um lado, como dissemos nas linhas interiores, o sector da saúde tem registado avanços e crescimento visível, por outro, o sector da protecção social de base continua a exigir atenção e melhorias profundas. E isso só se alcança com políticas públicas consistentes e acções concretas, que traduzam em resultados reais o compromisso de construir um país mais justo, solidário e humano.

